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São Paulo, 02 de agosto 2005
Prezado :
CNPCP:
Referência: criação de uma Polícia Penitenciária
A Pastoral Carcerária Nacional gostaria de trazer algumas reflexões com relação àmovimentação dos agentes prisionais do estado de Amapá que visam a instalação de uma polícia penitenciária armada, cita-se a seguir referências de legislação (A), que conheço, para depois apresentar (B)uma visão básica, mas não em tudo fechada, da PCr Nacional.
A:
Normas da ONU: Regras Mínimas da ONU [RM] 54,1.3; Código de Conduta para Funcionários de Execução da Lei –art. 3 e 5; Princípios Básicos relativos ao Uso de Força e Armas de Fogo por Funcionários de Execução da Lei, Princípio 4 e 9.
Constituição Federal, art. 5º XLIX [Comentário: A PCr percebe nos estados onde ASPs/APs ou a polícia militar portam ou usam armas de fogo no cotidiano que este fato constitui uma contínua agressão e tortura psicológica que só revolta os presos e contribui para um clima mais perigoso e que dificulta que os internos se recuperem].
Lei de Execução Penal [LEP] – Lei 7.210/84 (confira na Exposição dos Motivos da Lei de Execução Penal do 9/5/83 quanto ao conteúdo e espírito dos itens 13-14, 20-22, 63-76), e que cita no item 22 que “la ejecución penal humanizada no sólo no pone em peligro la seguridad y el orden estadal, sino todo lo contrário. Mientras la ejecución penal humanizada es un apoyo del orden y la seguridad estadal, una ejecución penal deshumanizada atenta precisamente contra la seguridad estadal”(Hilde Kaufmann: Principios para la reforma de la ejecución penal, Buenos Aires, 1977, p.55).
Manual para servidores penitenciários do Internacional Centre for Prison Studies- Londres/Ministério da Justiça “Administração Penitenciária: Uma Abordagem de Direitos Humanos” (Londres: 2002, edição brasileira: 2004) que fala da natureza não-policial do sistema
penitenciário – pág.27s., 38 -, e que “Não é prática recomendada que os servidores penitenciários que trabalham diretamente com os presos portem armas”.
[Estatuto da Polícia do Brasil: referente à vigilância externa, exclusivamente, como atribuição da polícia militar, fora de casos de rebeliões e revistas do tipo “pente fino” preventivas em caso de rebeliões].
B:
A posição da coordenação da PCr Nacional, e também a minha, como coordenador nacional, decorrem do reconhecimento da importância dessas normas acima mencionados e de experiências, visões e avaliações como apresentadas a seguir:
1. O estado de São Paulo criou em 2003 uma Guarda Penitenciária armada. Esta substitui os PMs (Polícia Militar) nas muralhas e o segundo passo é que esta Guarda assuma também o serviço de escolta às transferências dos presos para o fórum, hospital ou outras unidades prisionais. Esta Guarda não pertence à Secretaria de Segurança Pública, mas à Secretaria de Administração Penitenciária [Sub-Secretaria da Secretaria da Justiça (e de DH) em alguns estados], à qual são subordinados desde sempre os Agentes Prisionais – não armados - de Segurança e Disciplina [ASP/AP].
A Guarda Penitenciária (armada) do estado de São Paulo é proibida de agir dentro dos presídios,
mas deve fazer a segurança “externa” e eventualmente escoltas, no sentido de que nenhum preso possa fugir. Isto significa que temos em São Paulo agora dois tipos de Agentes de Segurança Penitenciária, os não armados e os armados. Ambos pertencem à mesma Secretaria do Estado. Com isto, os diversos serviços necessários num presídio se completam, hoje em dia, de forma muito mais fácil e harmônica do que antes, quando os PMs fizeram o trabalho de segurança externa. Antes, quando os funcionários de segurança externa eram os PMs, estes não deviam obediência o Secretário do Estado da Administração Penitenciária ou ao diretor do presídio, uma vez que respondiam à outra Secretaria. Então sua colaboração dependia, ao mesmo tempo e numa certa dose, também do seu bom humor, de sua boa vontade. Houve menos cooperação e mais conflitos ou faltas, tanto administrativas como entre os presos e os funcionários PMs da muralha. Esses conflitos se intensificaram muito mais ainda quando os presos doentes eram transportados para o hospital. Antes, no estado de São Paulo, muitas vezes eram alocados a um presídio aqueles soldados da PM, que já não tinham prestado para outro serviço e incorreram em faltas disciplinares. O serviço na penitenciária era uma espécie de castigo. Hoje, os guardas da muralha estão hierarquicamente submetidos ao diretor do presídio e sua Secretaria de Estado, da forma como também os outros funcionários do sistema penitenciário o são. Logo, quando tiver um problema de relacionamento entre os funcionários internos, ou os presos, com os agentes de muralha, a própria Secretaria e/ou o próprio diretor apuram e/ou resolvem de modo muito mais fácil e rápido. Outrossim, a formação para a Guarda Penitenciária não é somente policial, mas é realizada dentro dos objetivos da LEP. Isto é, a formação e critérios de admissão dos guardas seguem a nova filosofia penitenciária que tenta ser humanista. Acabou a história e prática de que quem não prestou em outro lugar por irresponsabilidades é destinado para trabalhar no presídio.
Sabe-se que atualmente diversos estados estão refletindo a introdução de uma guarda penitenciária própria ou já a preparam. Minha posição como coordenador nacional da PCr é de pleno apoio. E refletimos, inclusive, que este item faça parte das nossas propostas para melhorar o sistema prisional e penitenciário nos estados.
2. Um outro aspecto é o seguinte: Sempre existia uma corrente forte de ASPs/APs que aderiram publicamente à filosofia de polícia no seu serviço no interior dos presídios. Esse tipo de funcionário sente-se frustrado com sua situação, pois queria ser policia, mas não o é, é no máximo um policial de segunda categoria, porque tem restringido para trabalhar com o porte de arma de fogo. O sonho desse tipo de funcionário era e é a adequação à carreira de polícia; inclusive, no que diz respeito aos direitos salariais, de seguro, de aposentadoria, plano de carreira e concurso etc., que a polícia tem.
Considerados os itens anteriores:
a) A PCr é totalmente contra posição que quer introduzir uma filosofia de polícia e permitir o porte de armas de fogo dentro dos presídios (serviços internos). ASPs/APs nunca sejam autorizados a portar arma de fogo no interior do presídio. Consideramos uma (re-)militarização dos presídios antagônico aos objetivos da LEP no sentido de uma “harmônica” reintegração à sociedade. No final das contas, este objetivo é a razão de o convênio com a ONU prever que o detido pode ficar não mais de 24 horas nas mãos da polícia: a polícia é para prender e não para “re-socializar”. Funcionários da categoria dos ASPs/APs - que procuram uma identidade profissional policial, e não uma identidade profissional de trabalho (co-operativo) num projeto sócio-educacional e de recuperação de pessoas - precisariam mudar, procurar trabalho em outro lugar que não dentro dos presídios.
b) A PCr é a favor de uma adequação dos ASPs/APs e Guardas Penitenciárias aos direitos não militares da polícia, que são direitos salariais, de seguro de vida, aposentadoria com 25 anos de serviço, plano de carreira exclusivamente com concurso e estabilidade de emprego/pragmatização etc., ou seja, benefícios trabalhistas [RM 46,1.3], e no caso de uma Guarda Penitenciária o porte e uso de arma estaria incluído, mas limitado à vigilância externa. Somente com esta restrição quanto a uma adequação poderíamos, mas talvez até devêssemos apoiar a articulação dos ASPs/APs e Guardas Penitenciárias em nível nacional para uma emenda constitucional. Sua luta visa a inclusão de sua categoria profissional no capítulo III da Constituição Federal, que trata no artigo 144 dos diversos órgãos da Segurança Pública, entre os quais a categoria de segurança penitenciária quer ver-se incluída.
3. A posição e proposta da Pastoral Carcerária é, que:
a) o serviço da Segurança Prisional/Penitenciária seja incluído entre os órgãos de Segurança Pública desde que neste serviço se crie e/ou distinga entre duas subcategorias profissionais:
R a sub-categoria dos ASPs/APs, responsáveis pela segurança e disciplina interna com proibição de porte de arma;
R a sub-categoria da Guarda Penitenciária armada, destinada exclusivamente para serviços de segurança externa nas muralhas, nas guaritas e nas escoltas.
b) o serviço da Segurança Prisional/Penitenciária esteja subordinado à Secretarias da Justiça/(Sub-)Secretarias de Administração Penitenciária e seus respectivos secretários, e não às Secretarias de Segurança Pública.
R a sub-categoria dos ASPs/APs, responsáveis pela segurança e disciplina interna com proibição de porte de arma;
R a sub-categoria da Guarda Penitenciária armada, destinada exclusivamente para serviços de segurança externa nas muralhas, nas guaritas e nas escoltas.
b) o serviço da Segurança Prisional/Penitenciária esteja subordinado à Secretarias da Justiça/(Sub-)Secretarias de Administração Penitenciária e seus respectivos secretários, e não às Secretarias de Segurança Pública.
Atenciosamente,
Pe Gunther Zgubic
Coordenador Nacional da Pastoral Carcerária
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